21/08/2022 às 06h00min - Atualizada em 21/08/2022 às 06h00min

Entrevista: ‘Questionar sistema eleitoral é perda de tempo’

Chefe do cartório da 33ª zona eleitoral em Mossoró, Luiz Sérgio Monte discorre sobre aspectos fundamentais das eleições2022

Chefe do cartório da 33ª Zona Eleitoral, Luiz Sérgio Monte (foto: Reprodução/TCM)
Há 16 anos servindo à sociedade por meio da Justiça Eleitoral em Mossoró, Luiz Sérgio Monte conversou com o PORTAL JURÍDICO, sexta-feira (19), sobre as atribuições no pleito deste ano da 33ª Zona Eleitoral, cujo cartório chefia. Discorre, principalmente, sobre propaganda eleitoral, iniciada terça-feira (16), e reafirma a segurança do sistema de votação brasileiro. Confira:
 
 
PORTAL JURÍDICO – A campanha estadual difere da municipal em termos de trabalho para a Justiça Eleitoral em Mossoró?

LUIZ SÉRGIO MONTE – Ambas as eleições são desafiantes, tanto a municipal quanto a geral deste ano. Mas eu diria que a municipal guarda, sim, certas peculiaridades devido sobretudo à proximidade dos candidatos com relação ao eleitorado e, principalmente, pela competência processual que as zonas eleitorais detêm sobre a campanha da eleição. Então, todos os processos, questionamentos judiciais numa eleição municipal se dão numa zona eleitoral, e aí a gente tem aqui o exercício de diversas competências processuais, como ações de investigações judiciais eleitorais, ações de impugnação de mandato eletivo, impugnações a registros de candidaturas, representações por propagandas irregulares, direito de resposta no horário eleitoral gratuito. Então, toda competência processual fica com as zonas eleitorais. E aí, na eleição geral, essa parte processual é da competência do TRE (Tribunal Regional Eleitoral), da sede do TRE, em Natal. Então, o nosso trabalho numa eleição geral como a do corrente ano fica restrito apenas à parte administrativa, de organização dos trabalhos relativo à coleta dos votos e à transmissão dos resultados.

PJ – E como se dá essa organização?

LSM – Aqui em Mossoró são praticamente 90 locais de votação, com mais de 300 secções eleitorais, considerando as duas zonas eleitorais somadas. Então, temos o trabalho de coletar esses votos, transmiti-los, e, na eleição municipal, além de fazer isso, nós temos a competência processual de solucionar as lides durante o transcorrer da campanha eleitoral. E claro, somado a isso, tem a questão, também, da proximidade dos candidatos, muito mais próximos, totalmente local a eleição, e aí você também sente um grau de acirramento quase sempre maior do que é verificado numa eleição geral.

PJ – A eleição municipal, portanto, é mais trabalhosa?

LSM – Sim, ela termina sendo mais trabalhosa para a gente, embora ambas sejam desafiantes, porque sempre é um desafio à parte coletar cerca de quase 200 mil votos aqui em Mossoró e divulgar os resultados.

PJ – A propaganda eleitoral começou semana passada. De que forma essa etapa impacta na rotina da 33ª Zona Eleitoral?

LSM – Como aqui em Mossoró nós temos duas zonas eleitorais, pela legislação, uma delas é designada para desempenhar a chamada função de poder de polícia administrativo sobre a propaganda eleitoral. E nada mais é do que a possibilidade de fiscalizar, de ofício, a propaganda e fazer cessar a propaganda irregular no ato, durante o seu acontecimento. Então, na prática, é desligar o carro de som que excede o seu horário, remover bandeiras de um local irregular. É remover cavaletes que sejam colocados, eventualmente colocados, já que cavalete é proibido, pinturas em muro, notificar o candidato para que ele apague a pintura, pois pintura não é mais permitida. Então, são as providências que se toma para fazer cessar a propaganda irregular. E essa competência é da 33ª zona por designação do TRE. Então, a zona 33 fica responsável por exercer esse poder de polícia, inclusive, nós temos uma equipe de fiscalização que já foi designada pelo juiz eleitoral para atuarmos de ofício, in loco, onde estão havendo as movimentações.

PJ – Como é feito esse trabalho, na prática?

LSM – Acompanhamos, sobretudo nos finais de semana, as movimentações, carreatas, passeatas, comícios, reuniões, panfletaço, e aí a gente acompanha de perto, acompanhando a regularidade desses atos, dos carros de som, as áreas em que não podem circular. Fazemos esse trabalho de acompanhamento da propaganda eleitoral pelos candidatos. Então, de certa forma, isso impacta, sim, no trabalho, porque é uma demanda própria nesse sentido de acompanhar a execução dessas propagandas que ocorrem na cidade. Inclusive, também, nós recebemos denúncias pelo aplicativo Pardal.

PJ – Qual a finalidade desse aplicativo?

LSM – O aplicativo Pardal possibilita ao eleitor que queira denunciar uma propaganda eleitoral irregular, um crime eleitoral que esteja acontecendo, ele pode fazer através do aplicativo Pardal, que pode ser baixado no celular do eleitor. Ele pode encaminhar, inclusive, fotografias e vídeos para que nós possamos aferir a regularidade da propaganda e, se for o caso, nos deslocarmos até lá, a fim de fazer cessar eventual propaganda irregular.

PJ – Quando a Justiça eleitoral identifica uma irregularidade, qual o procedimento?

LSM – Bom, quando a ilegalidade é flagrada, nós da equipe de fiscalização temos a incumbência de fazê-la cessar. A gente precisa remover uma propaganda irregular. Uma vez removida, uma vez paralisada, nós lavramos o auto respectivo e o enviamos à Promotoria Eleitoral, que, por sua vez, pode remetê-la à Procuradoria Regional Eleitoral, em Natal, tendo em vista que os candidatos são de uma eleição geral, e compete ao Tribunal analisar eventuais processos que visem à aplicação de multas. Então, como a eleição é geral, na zona eleitoral, aqui na ponta, a gente só faz cessar a propaganda irregular. A gente busca fazer cessar a propaganda, interrompe a sua realização. As eventuais sanções que venham a ser aplicadas, como multas, elas são aplicadas pelo TRE, em Natal, a partir de um processo que pode vir a ser movido pelos entes legitimados, candidatos adversários, partidos adversários, Ministério Público Eleitoral, os quais podem entrar com a representação cabível e o candidato pode vir a sofrer aplicação de uma multa.

PJ – Quais as implicações da propaganda irregular?

LSM – Propaganda eleitoral irregular sempre gera multa e, em alguns casos, ela pode vir a gerar uma cassação, dependendo de todo um apurado das circunstâncias do caso. Claro que, se você configurar um abuso de poder econômico, abuso de poder político, você pode ter aí a possibilidade de cassação, mas, via de regra, a propaganda eleitoral irregular é punida com sanção. E, neste ano, são sanções aplicáveis pelo TRE, em Natal, a partir de processos movidos pelos órgãos legitimados, como eu falei: candidatos, partidos, coligações adversárias, e mais o Ministério Público Eleitoral.

E o candidato, claro, ele só vem a sofrer a sanção se ficar caracterizado, no processo, que a propaganda foi praticada por ele, como no caso do uso do seu perfil na rede social para uma propaganda irregular, ou, no caso de uma propaganda de rua, se restar caracterizado que não havia como o candidato não saber daquela propaganda. Eu digo isso porque, muitas vezes numa ilegalidade verificada na rua, o candidato pode alegar que não sabia da exibição daquela propaganda, daquela veiculação e, pelas circunstâncias do caso, se ficar caracterizado que, de fato, era razoável que ele não soubesse, ele fica isento de responsabilidade.
Porém, em certas circunstâncias, como, por exemplo, um outdoor colocado em frente à sua residência, que, uma vez removido, ele venha a dizer que não sabia, nesse tipo de hipótese geralmente não se aceita esse argumento, porque não havia como o candidato não saber da exibição de uma propaganda irregular que era de frente a sua residência, de frente ao comitê de campanha, de frente a um grande comício que ele realizou. Então, se pelas circunstâncias do caso, ficar apurado que não havia como ele não saber, aí sim, ele pode vir a ser multado pelo exercício de propaganda irregular. Mas, há outros casos em que realmente ele alega que não sabia e as circunstâncias denotam que, de fato, era possível que ele não soubesse, era razoável que ele não soubesse, e aí a Justiça Eleitoral costuma absolvê-los nesse caso.

PJ – Que tipo de sanção pode sofrer o eleitor que praticar propaganda eleitoral irregular?

LSM – O eleitor que cometer irregularidade na veiculação de propaganda eleitoral fica sujeito à aplicação de multa prevista na legislação. Multas que são relativamente pesadas. Elas costumam ter o valor mínimo estipulado em R$ 5 mil.

PJ – Alguma mudança na legislação, se compararmos ao pleito de 2020, chama atenção para 2022 em matéria de propaganda eleitoral?

LSM – Não. Na verdade, não existe nenhuma mudança significativa com relação às regras da propaganda. São praticamente as mesmas regras de 2020, continuam as mesmas proibições, por exemplo, a do carro de som circulando individualmente fora das movimentações, ele não pode circular; proibição de outdoor, proibição de confecção e distribuição de qualquer bem que represente vantagem econômica ao eleitor, como camiseta, boné, caneta, chaveiro. Tudo isso fica proibido, cavaletes são proibidos, pinturas em muro é proibida. Então, praticamente as regras serão repetidas da eleição de 2020. Nós não temos grandes novidades com relação a esse aspecto de propaganda eleitoral. As regras continuam vigentes e válidas para a eleição de 2022.

PJ – Alguns fatos já chamaram atenção nesses primeiros dias de propaganda eleitoral em Mossoró?

LSM – Bom, a campanha eleitoral iniciou-se agora, na última terça-feira, dia 16, e nós não temos, ainda, nenhum fato digno de registro, alguma irregularidade que merecesse uma maior atenção maior aqui por parte da equipe de fiscalização. Geralmente, começa muito tranquila a campanha, geralmente os momentos mais delicados costumam ocorrer mais próximo do final da campanha, quando já chegamos perto da eleição. Então, até o momento não há nenhum fato ainda digno de registro na primeira semana que merecesse uma atenção especial. Estamos aí, indo para o primeiro final de semana das movimentações de campanha (esta entrevista foi concedida sexta-feira, 19) e vamos acompanhar de perto, a fim de aferir a regularidade dos fatos, das movimentações que estão previstas para este primeiro final de semana.

PJ – A fiscalização da propaganda na Internet é um desafio à parte?

LSM – Isso. Fiscalizar propaganda na internet não é tarefa fácil, é um desafio à parte, sim. Nós temos que permanecer atentos. Nesse período, estão proibidas algumas práticas, por exemplo, o eleitor impulsionar conteúdo de candidato, isso aí é proibido. Claro que o eleitor pode replicar conteúdo postado por candidato; o eleitor não pode é se valer daquela ferramenta do impulsionamento. Ele não pode pagar a um aplicativo de celular para que ele faça o disparo para uma gama de seguidores que não são do seu rol de seguidores. Aquele impulsionamento, aquela propaganda patrocinada só quem pode fazer é o candidato. Ao eleitor não é permitido usar de mecanismos de impulsionamento para fazer chegar para além de seus seguidores aquele conteúdo em favor de um candidato.

E também estão proibidas nesse período as enquetes, as famosas enquetes, aquelas indagações que se faz aos seguidores, perguntando em quem eles votariam, e ficam divulgando ali nas redes sociais. Isso ainda é permitido no primeiro semestre do ano, vamos dizer assim, então a gente via muito isso, mas, nesse período de campanha propriamente dito, a legislação não permite que se faça uso dessas sondagens informais, dessas enquetes em redes sociais. Então, é um outro mecanismo, uma ferramenta que o eleitor não pode utilizar nesse período, se valer de enquetes para, assim, ficar discutindo temas eleitorais. Isso aí também é proibido e demanda nosso trabalho de fiscalização. A gente tem que ficar sempre atento, além do trabalho na rua, nós também temos que ficar atentos a esse trabalho que deve ser feito junto às redes sociais, principalmente, mas na internet como um todo.

PJ – Qual a recomendação para candidatos, militantes políticos e eleitores?

LSM – Olha, a gente sempre recomenda aos candidatos que busquem uma assessoria jurídica que lhes dê suporte nesse período de campanha. Há uma série de regras que tem que ser observada, sobretudo, para o uso da propaganda eleitoral na internet, e muitas vezes são regras que passam despercebidas e os candidatos acabam incorrendo em ilegalidades que fazem com que eles sejam sancionados, ou seja, recebam aplicação de uma multa, muitas vezes até por desconhecer a legislação. Então, a gente sempre orienta aos candidatos, a sua militância, que busquem uma orientação jurídica que dê suporte nesse período de campanha, a fim de que sejam evitadas as práticas de ilegalidade muito comuns nesse período, muitas vezes até por desconhecer certos detalhes previstos na legislação.

PJ – Existe algum exemplo disso?

LSM – Em 2020, alguns candidatos se valeram maciçamente das redes sociais, porém, uma grande parte deles não fez o registro dos links das páginas em que fariam essas propagandas, e aí muitos deles pagaram uma multa, e estão pagando, inclusive, ainda, de maneira parcelada, muitos deles, as multas que foram aplicadas pelo desrespeito a essa norma que previa o registro, com antecedência, dos links das páginas que seriam utilizadas para a veiculação de propagandas eleitorais. Então, é bom que se frise isso, a propaganda eleitoral nas redes sociais é permitida, contudo, o candidato tem que fazer os registros das páginas que ele utilizará para veiculação dessas propagandas. Essa é uma exigência prevista para os candidatos, e não para os eleitores. Então, se o candidato deseja veicular a propaganda nas redes sociais, ele tem que informar o link, o endereço respectivo no qual fará essas propagandas.

Muita gente não observou essa exigência em 2020 e, aqui em Mossoró, só para se ter uma noção, foram mais de 150 candidatos multados, numa multa cujo valor mínimo é de R$ 5 mil. Então, foram decisões já aplicadas, confirmadas em última instância, no TSE, em Brasília. Muitos já pagaram à vista, outros estão parcelando, outros foram para a dívida ativa porque não pagaram espontaneamente. Então a gente sempre orienta que os candidatos e sua militância procurem essa assessoria que lhes forneçam o suporte adequado.

PJ – E quanto aos eleitores? Qual a recomendação?

LSM – Quanto aos eleitores, a gente sempre recomenda que permaneçam atento na campanha, que atentem-se às propostas dos candidatos. Nós temos aí vários meios de propaganda: internet, mais à frente teremos a televisão e o rádio; escute bem, faça uma pesquisa sobre o passado, o histórico do candidato, a sua vida pregressa, a sua biografia, a seriedade com que desempenhou cargos públicos no passado, funções públicas em geral, para vir a tomar uma decisão sensata, pensada, para evitar decisões tomadas de última hora, de maneira até impensada. Permaneça longe, também, de propostas indecorosas, que tentem o seu aliciamento, que tentem a comprar o seu voto. Então, busque votar com consciência, após refletir bem sobre as propostas e a biografia dos candidatos que estão buscando seu voto.

PJ – O que senhor diria a quem insiste em tentar desacreditar o processo eleitoral brasileiro?

LSM – Olhe, todo esse questionamento que surgiu nos últimos anos sobre a confiabilidade das urnas eletrônicas e o sistema eleitoral brasileiro como um todo, a minha opinião pessoal é que isso é uma total perda de tempo. Eu posso atestar, pela minha experiência de 16 anos de servidor no Tribunal Regional Eleitoral deste estado, é que as urnas, de fato, são confiáveis, detêm inúmeros mecanismos de segurança, já são aplicadas no Brasil há 26 anos, e até hoje não teve uma fraude sequer comprovada.

A gente faz um trabalho com essas urnas, desde muito antes da eleição, a sociedade sempre demonstrou alta confiança nesse trabalho, tanto o é que não acompanha o nosso trabalho de, por exemplo, quando nós vamos fazer a carga das urnas, inserir as informações oficiais em cada uma das urnas, colocar os candidatos que estão aptos a receber os votos nela, os eleitores que estão aptos a votar. A gente faz isso, e é um procedimento que nós avisamos com antecedência, divulgamos na imprensa, fica o procedimento sendo feito aqui de portas abertas para que eventuais pessoais interessadas em fiscalizá-lo possam comparecer, candidatos, partidos políticos, OAB, Ministério Público, e até hoje, praticamente ninguém comparece para fiscalizar.
Então a gente faz todo o trabalho aqui, somente nós servidores aqui fazemos o trabalho, as urnas são lacradas, são enviadas aos locais, os boletins de urnas são impressos antes dos votos serem transmitidos através das redes de internet aqui da Justiça Eleitoral. Então, assim, tudo é feito com muita transparência, as urnas são auditáveis, então, não há motivo, não há razão nenhuma para se desconfiar desses resultados. Posso dar aqui meu testemunho pessoal da experiência já adquirida ao longo de 16 anos aqui à frente da 33ª zona eleitoral.

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